Nos últimos anos, o Brasil viu crescer de forma alarmante o número de pessoas envolvidas com os jogos de apostas online, popularmente chamados de “bets”. O que antes era restrito a cassinos em outros países, agora está disponível a qualquer hora, no celular, com apenas alguns cliques. Esse fácil acesso colocou a ludopatia — também conhecida como transtorno do jogo — em destaque como um problema alarmante de saúde pública.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a ludopatia é classificada como um transtorno de comportamento marcado pela incapacidade de resistir ao impulso de jogar, mesmo diante de prejuízos pessoais, familiares e financeiros.
Quando a diversão vira um transtorno
Estamos acostumados a ouvir falar de dependência em relação a substâncias, como álcool ou outras drogas. Mas a psiquiatria explica que também existe um outro tipo de dependência, as dependências comportamentais, e o jogo é uma delas.
O transtorno do jogo compartilha as mesmas características de uma dependência química: desejo intenso, perda de controle, tolerância (necessidade de aumentar o tempo ou o valor apostado) e abstinência (ansiedade e irritação quando não se joga). A diferença é que, em vez de o estímulo acontecer por uma substância, o que ativa e alimenta o vício é o próprio comportamento.
Da roleta ao celular: como as apostas ficaram mais acessíveis
No passado, quem quisesse jogar precisava se deslocar até um cassino, gastar tempo, dinheiro e, muitas vezes, até mesmo viajar para fora do Brasil. Hoje, o jogo está a apenas um clique de distância, e essa facilidade mudou o perfil de risco.
As pessoas não precisam mais planejar uma viagem ou uma ida à casa de apostas, ela começa a jogar porque está entediada, porque viu uma propaganda no ônibus ou porque viu um anúncio nas redes sociais. O celular, principal via e incentivo para o jogo, está presente a todo tempo, seja no bolso ou na mão do usuário, dificultando a parada. Em comparação, é como se o celular fosse uma “garrafa de bebida” que está sempre por perto de quem sofre com a dependência de álcool.
O sequestro do sistema de recompensa
Nosso cérebro possui um sistema de recompensa que funciona principalmente através da dopamina, neurotransmissor associado ao prazer, motivação e aprendizado. Normalmente, ele reforça comportamentos adaptativos como se alimentar, interagir socialmente ou manter relações afetivas.
No jogo patológico, esse sistema é ‘’sequestrado’’. Como o ganho é incerto, às vezes a recompensa direta aparece e às vezes não. Essa imprevisibilidade aumenta a liberação de dopamina e intensifica a excitação ligada ao ato de apostar. O resultado é uma perda de controle: a busca pela recompensa se sobrepõe ao julgamento racional, levando a decisões cada vez mais prejudiciais.
Consequências do vício em jogos
A ludopatia leva a um ciclo de compulsão e prejuízos. O indivíduo pode:
- Jogar no trabalho ou enquanto dirige; se colocando em situações de risco
- Negligenciar obrigações familiares e profissionais;
- Se afastar da família e dos amigos;
- Viver em constante ansiedade, culpa e desespero.
Apesar de perceber os danos, a pessoa não consegue parar. Isso porque o sistema de recompensa está dominado pelo jogo, e o comportamento compulsivo se mantém.
Quem está mais vulnerável?
Pesquisas apontam alguns fatores de risco:
- Sofrimento emocional prévio ou transtornos psiquiátricos associados (depressão, ansiedade, abuso de substâncias, TDAH);
- Início precoce das apostas (quanto menor a idade de início, maior a gravidade);
- Pertencer às classes C e D, onde muitas vezes o jogo é visto como uma possibilidade rápida de ‘’mudança de vida’’
- Sexo masculino, mais frequentemente associado ao comportamento de risco.
Em resumo, a grande maioria das pessoas afetadas pela ludopatia já pertence a uma população vulnerável — e o jogo pode agravar ainda mais essa fragilidade, levando à perda de patrimônio e a endividamentos importantes.
Questão de saúde pública e social
No Brasil, as apostas esportivas online foram liberadas recentemente e já movimentam bilhões. Com isso, a demanda por tratamento cresceu exponencialmente — sobrecarregando um sistema de saúde já saturado.
As consequências vão muito além da saúde e incluem endividamento familiar, rupturas conjugais, violência doméstica, impactos econômicos e sociais. Assim, a ludopatia deve ser vista não apenas como uma questão individual, mas como um desafio de saúde pública, que repercute em diferentes âmbitos da sociedade.
Como tratar a ludopatia
O tratamento envolve uma combinação de psicoterapia e medicamentos para sintomas associados, como ansiedade e depressão. O acompanhamento médico é fundamental, já que o vício em jogos é um transtorno de dependência e está frequentemente associado a outras questões psiquiátricas, como ansiedade ou depressão.
Precisamos falar sobre o vício em apostas
O vício em apostas não é uma brincadeira ou um hábito inofensivo, mas um transtorno psiquiátrico com impacto devastador na vida de quem joga e de seus familiares. Reconhecer os sinais, buscar informação e procurar ajuda especializada são passos fundamentais para interromper o ciclo.
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